5 de novembro de 2011

A pele que habito... lobo em pele de cordeiro


A impecabilidade almodovariana segue na medida certa do cinema não convencional, desta vez transitando entre a epiderme, a derme e a hipoderme.

As mínimas coisas que escolhemos fazer ou deixar de fazer, acarretam consequências previsíveis ou sequer imagináveis. Uma hora, um local, uma pessoa, certos ou errados, desencadeiam fatos que podem tecer diferentes rumos para uma trajetória. Assim é a vida, assim é trama almodovariana.

Sem nem passar perto do equívoco dualista "habitar um corpo", o enredo desfia o drama de um corpo-sujeito revestido por uma pele estranha. Experiência desoladora a de ter uma aparência exuberante que não lhe pertence. Vivência desconcertante o corpo estar revestido de uma pele que não é a sua.



Como entender a própria identidade quando, da aparência desta, restam apenas os olhos assustados?

O que nossa aparência pode dizer daquilo que realmente somos (ou somos forçados a ser)?

A quantas camadas de pele está nossa identidade?

O encontro de cores orquestrado por Almodóvar revela a delicadeza de um olhar sensível em encantar, motivar e questionar outros olhares. Os personagens hediondos, as mulheres incríveis, os gêneros duvidosos, os enquadramentos excêntricos, as situações polêmicas, tudo bricolado com a picardia ardilosa do "Pedrinho", o menino cineasta que constrói travessuras belíssimas em forma de imagens.



Para quem nunca duvidou da própria pele, convém se enxergar direito, depois de uma dose do elixir imagético do diretor Pedro Almodóvar. Nem precisa ser bom entendedor, as perguntas transpiram pelos poros involuntariamente.

"A pele que habito" (2011) pode deixar nossa indignação, ética, medos, emoções e preconceitos à flor da pele, como se as imagens nos tocassem causando arrepios e lágrimas bem no suspiro final, quando voltar para os braços da mãe pode (re)significar tudo.



Imagens capturadas aqui.

Um comentário:

  1. Para alguém habitar a pele que Pedro tece, é imprescindivel ter poros e pêlos filosoficos, para reconstruir a cada palavra a teia do desejo violado e do pecado perseguido. Da aparência do que é, escondendo aquilo que a cada instante deixa de sê-lo!
    A pele que habito é a mesma que me escondo, que me mostro, mas somente eu sei disso... e vc também, porque um dia habitamos numa pele similar... e ligamos nossas teias... mostrando e escondendo quem somos.
    Habitamos-nos!

    Carmi Silva

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