21 de março de 2015

STRIKE A POSE contra a homofobia!

Nos meados de março de 1990, Madonna lançava o videoclipe da música "Vogue". Vinte e cinco anos depois da música e videoclipe terem se propagado por todo o mundo - sem o veloz suporte da internet -, como fã de Madonna e pesquisador de Cultura Pop, pergunto: Por que ainda importa falar de Vogue? Por que faz sentido, hoje, no Brasil, perante tanta intolerância, fundamentalismo religioso, homofobia violenta, corrupção política, apelos a regimes ditadores e à família tradicional como modelo exclusivo, refletir sobre Vogue?

Videoclipe Vogue, direção de David Fincher

De modo estratégico, em 1990, Madonna se apropriou de elementos provindos de ambientes gays, articulados na década de 80: dança, desfiles, gestual, vestimentas, concursos, batalhas, performances. Forjado por gays e negros, esse ambiente underground de New York, especialmente no Harlem, chamado de Ball Culture, possibilitava, em diferentes clubes gays, que estes sujeitos expressassem, vivenciassem e se mostrassem de modos que, no dia a dia, a sociedade branca, patriarcal, machista e heterosexista  impedia que o fizessem.

No ambiente da Ball Culture surge a dança Vogue. A partir de imagens de revistas de moda (como Elle e Vogue), estrelas de cinema e de séries de TV, hieróglifos egípcios, movimentos de ginástica, poses de modelos, trejeitos femininos de passarela e de manuseio de instrumentos de maquiagem, era criada a dança Vogue. Entre os concursos e batalhas feitas nas "casas", como eram chamados os clubes, a dança Vogue era uma das categorias. Entre os expoentes da dança Vogue estão o dançarino e coreógrafo Willi Ninja (1961-2006), considerado "a mãe da Casa Ninja" e Jose Xtravaganza considerado "pai da House of Xtravaganza" e que dançou no videoclipe de Vogue com Madonna e em várias apresentações e shows da época. Jose estudou na School of Performing Arts, em La Guardia High School of Music and Arts e também foi bolsista na New School Ballet com 10 anos de idade.

Jose Xtravaganza. Foto de Len Prince.

Recentemente, Jose, junto com Slam, outro dançarino do videoclipe Vogue, em homenagem aos seus vinte e cinco anos, gravaram um vídeo, onde dançam... Motivo este que despertou-me, com emoção, essas palavras. Vinte e cinco anos depois, já não mais tão jovens, mas extremamente ágeis e exímios na execução de cada gesto da dança Vogue, essas imagens me questionam acerca da força política dessa dança, de outras danças, do corpo, do gesto.

Homens dançando Vogue, Stiletto, Stret Jazz, com ou sem sapatos de salto alto, são imagens de contravensão e subversão perante sistemas dogmáticos, fundamentalistas e homofóbicos. São imagens e ações performativas que instauram estranhamento, excedem as ações cotidianas que repetem, potencializam formas de uma política estética, (re)criam realidades possíveis e forjam políticas de representação e reconhecimento identitário dos sujeitos LGBTT.

Quando Madonna lança o produto Vogue, música e videoclipe, sim, ela produz mais uma mercadoria artística no vasto mercado da Cultura Pop, fruto de seu trabalho e daquilo que ela se propõe como cantora pop. Me instiga pensar que, a produção e venda de Vogue vem aliada à sua prática de defesa e reconhecimento dos direitos LGBTT, desde o princípio de sua carreira até hoje. Madonna nunca escondeu sua predileção por frequentar boates gays, conviver, trabalhar e defender estes sujeitos.

Penso que dançar Vogue, fazer pose e recriar esse estilo de dança na contemporaneidade é uma forma de fazer política, criar discursos gestuais críticos, criativos e performativos. É um modo de combater a ignorância, o fundamentalismo religioso, os falsos líderes que imbecilizam sujeitos com seus gritos, ritos e violências sagrados e ainda ocupam cargos políticos. Roubam seus fiéis, roubam os cofres públicos e ainda pregam a mais falsa, prepotente e misógina moral que se aplica somente ao sexo, àquilo que temos entre as pernas. Repudiam um beijo de novela entre duas mulheres? Jesus e seus discípulos se cumprimentavam com beijos, o ósculo da paz, diz na bíblia. Sim, homens se beijando.

Eles mutilam o próprio amor cristão, pois Jesus era um nazareno lindo, apaixonado pela vida e defensor de todos os excluídos e injustiçados e não esse bocó, branquelo e mágico-curandeiro que as religiões veneram. Perante esses que violentam as diversas expressões identitárias e a dignidade humana, repito a frase de Madonna (não à toa, Nossa Senhora): STRIKE A POSE - FAÇA POSE! O corpo é meio e mensagem ao mesmo tempo, portanto faça sua pose - política, faça jus à democracia e se expresse. AMÉM, IRMÃS!!! Come on, Vogue!

Prof. Dr. Odailso Berté