23 de setembro de 2010

Danças que movem moinhos no corpo da gente


O Teatro Castro Alves, de Salvador/BA, com a série TCA 2010 – Ano XV, vem alargando horizontes no quesito dança ao possibilitar que o público baiano prestigie diferentes espetáculos, mais ocidentais, mais orientais, mais velozes, ou, mais serenos. São inspiradas configurações de dança que pisam o mesmo palco e deixam diferenciados rastros nas pessoas que a elas acorrem.

Nos dias 04 e 05 de setembro de 2010 o Grupo Corpo pode mostrar toda sua velocidade e habilidade com os espetáculos ‘Ímã’ (2009) e ‘Lecuona’ (2004), ambos criados pelo coreógrafo Rodrigo Pederneiras.

‘Ímã’, conforme seus criadores, parte dos princípios de interdependência e complementaridade que regem as relações humanas. Um intenso tráfego de dançarinos velozes e habilidosos que entram e saem, se unem e se dissociam, marca a trajetória cênica que transfigura uma corrente ininterrupta de forças que se atraem e se repelem. A intensidade cênica é fortemente focada no corpo que dança, corpo ágil, virtuoso e atento em realizar uma movimentação profusa e veloz. Corpos imantados pela proposta a ser desempenhada.

‘Lecuona’ é uma homenagem ao músico e compositor cubano Ernesto Lecuona (1895-1963). Doze de suas canções românticas embalam os doze pas-de-deux que se seguem alternando cores, ciúmes, amores, saudades, rancores e desprezo. A poética linear, composta por performances que arrancam suspiros da platéia, dá margem para uma situação cênica diluída entre o fazer de cada casal. O final apoteótico completa o êxtase do público ao remontar um salão espelhado para uma valsa de seis casais. A música toca e os corpos dançam.

No dia 22 de setembro foi a vez do grupo japonês Sankai Juku brindar o público com sua serenidade e profundidade por meio do espetáculo ‘Tobari – Como num Fluxo Inesgotável’, concebido por Ushio Amagatsu. O grupo é formado por dançarinos da segunda geração do Butô. O Butô, que hoje compõe as bases da dança contemporânea japonesa, surgido nos fins da década de 1950, foi uma reação vanguardista à repressão e agressão ocidentais após a segunda guerra.

‘Tobari’ é uma palavra poética que pode significar um tecido que separa um espaço em duas partes, a passagem do dia para a noite, o presente e o futuro. A singeleza e perspicácia gestual possibilitam a elaboração de sentidos múltiplos, vistos e imaginados. Ao moverem-se, os corpos maquiados de branco exalavam pó, que, atravessando a iluminação e relacionando-se com o céu estrelado do cenário, trazia presente a lembrança de que nossos corpos são compostos por pó de estrelas. Diferente da lógica ocidental, ‘Tobari’ demonstra uma outra lógica estética organizativa onde a expressão dissolve a fronteira e/ou dualidade teatro x dança. O corpo enuncia, esboça e comunica uma espécie de celebração serena que emerge da sua íntima relação com o universo.

Foto: Odailso Berté

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