5 de março de 2012

Histórias Cruzadas, preto no branco para desmontar superioridades inventadas


Quando um filme acontece em nossa vida, quando histórias se cruzam com a nossa, nos sentimos mais enredados nessa verdadeira rede de enredos chamada vida.

1962, Estados Unidos, Mississippi, na cidade de Jackson, a luta pelos direitos civis encorajava muitos ao reconhecimento, à participação social, ao respeito. Tudo isso com especial referência aos negros e negras.

Dando atenção às mulheres negras (às mulheres negras domésticas), a história particulariza a vida de pessoas não ouvidas, não consideradas, contadas enquanto classe separada. As mulheres que embelezavam os lares, criavam os filhos, preparavam os alimentos... Não eram dignas nem sequer de usar o banheiro da casa. Atitude humana? Sim, postura de brancas e brancos, que se entendiam "superiores". Superior em que mesmo?

Baseado no romance "A Resposta" (The Help), de Kathryn Stockett, o filme "Histórias Cruzadas" (2012), dirigido por Tate Taylor, traz Viola Davis e Octavia Spencer vivendo personagens, ou melhor, mostrando-nos pessoas que, com suas trajetórias de dores e coragem, arrebentam sensivelmente com nossa burra postura que em tantos momentos nos faz preconceituosos.

Elas e tantas outras mulheres negras domésticas narram suas histórias como possibilidade de luta, como forma de serem vistas, ouvidas, respeitadas. Quando narrar a própria experiência é uma forma de continuar vivas, pessoas compartilham frugalidades, dores, pedacinhos miúdos de vida capazes de mover estruturas sociais e culturais por tempos arraigadas.

Ficam em mim semblantes de mães negras - divas, dádivas - capazes de amar, educar e alimentar mesmo quando o "pseudo superior" e a oposição preto x branco impõem-se com crueldade. A doméstica negra dando o amor que a mãe branca não sabia dar à própria filhinha, desmonta qualquer superioridade.

Ouvir e valorizar as histórias pessoais pode ser um comecinho do pagamento de uma dívida que, enquanto brancos e brancas, jamais conseguiremos saldar. Com isso penso na imensa inferioridade das classificações e discriminações que inventamos.

Ao ver Aibileen (Viola Davis) finalizar a trama andando, ao som da bela canção-tema "The living proof", tendo pela frente a profundidade de um caminho, vejo, literalmente, essa doméstica (que me representa tantas outras pessoas), como prova viva dos possíveis "milagres" cotidianos que somos capazes de realizar.



Imagem capturada aqui.

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