26 de agosto de 2012

Indelével recado


Caro amigo mascarado de ladrão (ou vicer-versa), qual será seu próximo disfarce? De Papai Noel ou quem sabe de Madonna, pra me agradar? Tenho de concordar que suas estratégias são táticas de novela. Me pergunto qual dos grandes autores globais usariam tais genialidades que você retira de seus mundos paralelos. Comparadas a você, "A próxima vítima" e "Vale tudo" são piadas previsíveis e sem graça.

Pensou que a ficha demoraria muito para cair? Até onde você deseja que eu lhe dê corda? Vou segurar aqui, pois você já está na beira do abismo. Veja com seus próprios olhos e cuidado com a queda. Que ela lhe conserve pelo menos os olhos esbugalhados para que possa ver que continuarei em pé enquanto você definha.

O que você realmente deseja de mim? Apenas esses aparelhos estúpidos que podem ser adquiridos em qualquer esquina? Pois se contente com sua insignificância e insucessos, aquilo que sou jamais lhe pertencerá. Meu conteúdo e estrutura, meus modos de ver o mundo e dar sentido às coisas jamais serão seus. Nem nascendo de novo o conseguiria, pobre diabo. Um dia você acaba se afogando nesse inveja lamascenta qua transborda pelo seu olhar peçonhento fingindo ares de inocência.

Sei que viestes no tempo certo, na hora marcada. Sei também que uma exposição, um café e um terreno baldio podem lhe servir de alibis. Sempre preferi acreditar que as pessoas são boas e que não existem complôs. Mas querido, você é a prova viva, o complô corporificado, ontem e hoje. Agora, fique atento, eu também posso ser um garoto mau, a meu modo, claro, sua sujeira não me contamina.

A lei do universo é ciclica, portanto, sua parte chega em tempo, confie. Não saímos ilesos da maravilhosa aventura terrestre. Me desculpe, eu já tenho rido com seus infortúnios e estou certo de que meu riso se dará em coro, orquestra e sinfonia com o que há de vir. Não por maldade, eu juro, não sou como você. Apenas por prazer, para aliviar as tensões que você deixou. O que, tenho certeza, são bem menores que sua desgraça.

Entenda, o que você realmente necessita é impossível de ser roubado. E se cuide, seus malgrados podem estar lhe esperando bem ali, na próxima esquina.

Imagem capturada aqui.

25 de agosto de 2012

Tietagens, preces e negações

 
As gotas quentes foram tocando-lhe a cabeça, encharcando os cabelos fio a fio. Pensamentos humedecidos, lembranças como unguentos escorrendo pelo corpo, molhados anseios, baldes de agua fria nas vontades. Desejos de escrita e representação, comunicado qualquer.

Não quis mais arregaçar as mangas, os 'nãos' que lhe foram dados em tão pouco tempo apontam a necessidade de ajuntar pedaços. Vendo-se como peixe e seu próprio pescador, apesar do banho, do suor e das lágrimas, encontra-se fora d'água.

Concursos, projetos, amores, furtos, compras... 'Nãos' encadeados como coreografia, sem entorno, sem fuga, sem arrego. Diretos, sem rodeios, cortantes. Bem mais que Pedro em suas míseras três vezes, negado, credo em cruz, agnus dei. Engolindo caroço de caju podre. Chateado com a academia que só faz é o povo engordar ao invés de ficar bonito. E, ainda, roubado, por ladrão infeliz e mequetrefe.

Os risos desses dias são contados com marca páginas rosa adornado com flor verde e amarela. Ele conta as folhas dos enredos da diva brejeira de Jorge Amado, puta e santa, cabrita e pomba, diva das dunas de Mangue Seco. Ela é quem lhe cochicha possíveis voltas, desgraças que podem frutificar ganhos nem sequer esperados. Eta, seria uma luz de Tieta?

O que ainda cabe a um cabrito, com porte de bode, que destrincha a idade de Cristo sem mistérios gozosos? Só terços dolorosos, em quartos sozinho. Melhor seria o quinto dos infernos, por segundos de paz e fogo... Velas perpétuas acesas, mais magras que a necessidade que o ronda. E ele é só um misto de cabrito e pastor que almeja um campo de aveia verde para dançar. Esse, o céu dos seus sonhos.   

Voltar? Rever o percurso de antes? Ou apenas entender um aparente regresso como parte do trajeto a seguir? Afinal, a vida não é tão linear como pretendem os clássicos historiadores. Dessas humidades, talvez outra cidade, da saudade, quem sabe felicidade. Se faz sentido pensar de modo rizomático: Amém! Que assim o seja.

17 de agosto de 2012

Não cabendo no peito, transborda pelos olhos


Eu queria vir a pé, mas uma solidária carona não deixou que gastasse o solado do tênis adentrando a brisa pelas ruas da noite, claro, lembrando você... Quando o ego dá esse rumo para o pensamento, o id pronuncia seu olhar de reprovação e veta toda e qualquer verba de consolo. Nesse tema eles não concordam, daí me percebo falando sozinho, sendo meio dualista, daquele jeito que não gosto e tanto critico.

No cinema, "À beira do caminho" (2012) conseguiu (co)mover lágrimas, saudades, lembranças e perdas através da simplicidade de frases de parachoque e canções de Roberto Carlos. Eu que nunca pensei chorar ao som do Rei, vi meu orgulho derrotado e o id - isibido - se desmanchando numa larga escala de risadas de pura satisfação.

João, Duda e Rosa saltam da tela e fazem da sala escura um pedaço do cenário de minha vida: das vezes não feitas de um pai, de um filho carente e sonhador, dos amantes que tremem ao mínimo toque e sofrem pela distância, por perdões e voltas. Poeirentas estradas, boléia de caminhão, fotos, um único cd, um endereço não mais habitado, afago materno, elementos que enredam histórias para dizer que viver é como desenhar tendo apenas lápis, sem nenhuma borracha para apagar. E que quando a saudade não cabe mais no peito, é pelos olhos que ela transborda.

Não bastasse as delicadezas do filme que perfuraram as membranas e autodefesas do ego, o debochado id, sem dó nem piedade, ainda destaca uma das canções do enredo e canta que canta, dança que dança... Sambando na cara do indefeso ego. Insisto em não ouvir, mas quem disse que o ingrato se cala?

Como Petrolina (um dos cenários do filme) faz divisa com Juazeiro, a noite me trouxe o perfume do agreste de Tieta, do Mangue Seco baiano. Entre o sabor de pamonhas e tantas possibilidades de navegação, Tonha, Perpétua, Amorzinho, Carmosina e a Cabrita Master inflaram saudades do tempo em que meus olhos infantes não bebiam a ousadia das insinuações vividas pelas personagens inspiradas na obra do amado Jorge. Hoje sim entendo que os berros de Tieta, se fazendo de cabrita, eram a mais pura intensão de uma lua cheia de tesão.

Despedi a carona, tomei o rumo da cama e tentei deixar as memóras do dia à beira do caminho. No entando, o chato do id, possuído por uma entidade cabrito,  segue seu cantarolar agora quase em ladainha. Insatisfeito por não encontrar a versão do filme, de Nina Becker, ele tasca em meus ouvidos a canção na voz de Marjorie Estiano, e assim me embala para dormir:

... Esqueça, se ele não te ama, esqueça, se ele não te quer
Não chore mais, não sofra assim
Porque posso te dar amor sem fim
Ele não pensa em querer-te, te faz sofrer e até chorar
Não chore mais, vem pra mim, vem
Não sofra, não pense, não chore mais, meu bem ...

E assim dorme o ego, tendo o id ninando seus sonhos que vão lentamente se desvanecendo num percurso que mistura fatos, filmes, fotos e fins... Fazendo da cama a continuidade de um caminho cheio de eiras e beiras.

Imagem editada da original capturada aqui.

16 de agosto de 2012

Sobre diabos, confissões e tipos


Sim, sou do tipo que idolatra Madonna, chora com comédia romântica, às vezes tem vontade de morrer, adora assistir e cantar com as empreguetes, se decepciona com a Joelma dizendo que Jesus pode curar um gay, acredita em amor, assiste várias vezes "O diabo veste Prada" e "Miss Simpatia", sofre quando não é aceito, lê "Os diários de Carrie" e torce pelo "Sex and the city 3". Triste demais pra você? Problema seu. Ah, também sou filósofo, dançarino e quase doutor, se ajuda a manter seu ar de reprovação. Se isso fosse bate-papo, agora viria um KKK.

Existem diabos que vestem Prada, diabos que roubam Dell, diabos que ouvem Madonna, diabos que inibem afeto. Adoraria vê-los todos juntos, cada um dizendo a que veio, sem se esconder ou ter que arrombar portas. Adoraria dormir com o inimigo, isto é, se já não o tenho feito.

Sou do tipo que não faz a linha "Baby" (da Família Dinossauro): "Você tem que me amar!" Todavia, sentir saudade de algo que não tenho, às vezes incomoda bastante. E vejo, descaradamente, o quanto se tornam patéticos os que se acham "os desejados", ridicularizando os desejantes. Tão patético que dá canceira na paixão.

Não tenho ouro nem prata, incenso ou mirra. Não tenho paciência para tratar quem quer que seja como rei, messias ou senhor. Não tenho oferendas para conquistar afeto. Apenas constato que mesmo se fosse livre, se afogaria nesse poço do sentidos, afeto e prazeres que posso ser.

Quase como canta Madonna em "Evita": Eu não espero que meus romances deem certo ou durem muito, não me iludo mais que sonhos vão se realizar. Acostumado aos problemas, eu os antecipo, todavia, odeio isso. Você não odiaria? Nas intempéries da vida se aprende a remar, construir, esquecer, perder e obter ganhos que vem das margens.

Sou do tipo que vai e volta sem stresses para recomeçar, quando a paciência permite. Acostumado a perdas grandes e menores, como de mãe e de computador, digo que estou de volta. Podem tirar-me os anéis, que ainda terei dedos para coçar o saco e o pescoço. Podem levar os instrumentos, pois as ideias, as imagens, os gestos, o ímpeto criador de cada ação segue pulsando aqui dentro. Pode tentar inibir meu afeto, pois eu... Posso dar um jeito nisso também... "You'll see"!

Imagem capturada aqui.

5 de agosto de 2012

Amizade em fase de teste


Alguns conhecidos, ao partilharem suas experiências com seus supostos amigos, por vezes me intrigam a ponto de mobilizar a vontade redativa. Talvez os tais supostos amigos nem reflitam com acuidade acerca do que dizem, talvez nem conheçam o sentido da palavra acuidade. E para pensar sobre tais ditos nem é preciso recorrer a Freud, Sócrates, Darwin, Jesus ou qualquer outro figurão. Os Backstreet Boys já fornecem pertinentes possibilidades reflexivas: Diga-me por que   (I want it that way); Mostre-me o significado de ser sozinho (Show me the meaning of being lonely).

Até que ponto um tema/situação assim merece atenção e a mobilização de reflexão e palavras? Qual seria sua reação se uma pessoa que você admira dissesse que a amizade entre vocês está em fase de teste? Nesta "admiração" não imagine uma paixonite boba, mas coloque ingredientes como bem querer, apoio, solidariedade, estímulo profissional, entre outros sentimentos, gestos, auxílios. Mesmo assim, a pessoa que você admira diz que está lhe testando.

Quais os pesos, níveis e medidas que podem estar sendo testados? Os ganhos, as possibilidades, os lucros que o outro pode favorecer? Relações seriam um tipo de experimento em que um sujeito neutro observa e pesquisa o outro/objeto para testar até que ponto este pode lhe servir? As relações seriam isso: experimentos premeditados, testes?

Um comentário curioso, do conhecido que passou por esse incidente, dizia que, tais amigos testadores, quase sempre, podem ser pessoas que usam de supostos sentimentos no intuito de adquirir, ganhar, obter, receber, angariar coisas/possibilidades/seguranças com a relação. Com o tempo se percebe que, como passam boa parte da vida apoiando-se em uns e testando outros, pouco constroem de sólido, que venha de seu esforço ou cooperação. Vão-se as relações/testes, vão-se os ganhos e as seguranças. E o que fica? Então diga-me, por que?

Será que para esse tipo de amizade vale o conhecido dito popular "antes só do que mal acompanhado"?

Sigo acreditando que as relações devem simplesmente acontecer, discorrerem pelo espaço-tempo, serem vividas como uma experiência que não tem cartilha, avaliação e revisão preestabelecidos. Eu prefiro desse jeito: os modos de ser/agir/sentir de ambos os sujeitos envolvidos vão mostrando limites, trocas, cumplicidades... Que não necessitam ser testados a priori, mas sentidos, experimentados e compartilhados ao longo da relação que é sempre algo processual.        

Imagem capturada aqui.